A igreja tem passado por grandes mudanças nas últimas décadas. Cristãos têm se movimentado de forma renovadora anunciando o evangelho. Cada vez mais círculos universitários são tocados por jovens apaixonados por Deus que não têm descansado até que todos à sua volta ouçam sobre o poder da salvação. Todos os dias ouvimos sobre novas mobilizações de evangelismo, treinamentos e envios missionários, temos impactado nossa “Judeia” e, quando digo isso, me refiro a estarmos alcançando aqueles que estão próximos a nós para, então, avançar e conquistar as nações. E, porque precisamos ter fome por Deus?
Assim como em Atos 1:8, quando Jesus ressurreto, prestes a ascender aos céus, disse àqueles que estavam reunidos com ele que eles seriam Suas testemunhas, tanto em Jerusalém, como em toda a Judeia e Samaria, e até aos confins da terra. E por todas essas iniciativas, somos felizes e damos graças ao Senhor. Porém, em contrapartida, em meio a tamanha oferta de alimento ao perdido, há algo essencial que pode estar nos faltando: A fome.
Veja essa conhecida frase de A. W. Tozer:
“Nós somos a soma da fome que temos”. Isso me faz pensar sobre o que é que temos desejado, e como Deus tem respondido à sua igreja nesses dias. Estaríamos nós desejando e pedindo por fome? E, por que precisamos tanto assim da fome?
Você, possivelmente, sabe que a falta de fome é um sinal de alerta. Quantas vezes já ouvimos nossos pais conversando preocupados a respeito do nosso estado de saúde ou de nossos irmãos ou irmãs, e eles dizem: “ele está sem fome, não quis comer nada o dia todo”. A falta de apetite físico é um dos mais evidentes sinais de que algo não está bem com o estado físico de alguém. Essa mesma verdade se aplica à nossa vida espiritual.
O que aprendi
Quando eu era criança, frequentemente buscava uma oportunidade de abrir um pacote de salgadinho antes das refeições ou tinha vontade de comer alguma “besteira” — essa era a forma que minha mãe chamava os alimentos que não tinham o valor nutricional que eu precisava para me manter saudável, mas que, na minha opinião infantil, era a melhor refeição que eu poderia ter e, constantemente, nos comportamos da mesma forma na nossa vida espiritual, nos alimentando de “besteiras”, comendo de tudo, mas pouco sendo nutridos por um relacionamento profundo com Deus.
E esses falsos alimentos nos mantêm saciados e impedem que a fome exerça seu papel fundamental: fazer com que comamos aquilo que vai definitivamente nos sustentar e nutrir. A fome, quando não saciada, resulta em fraqueza. Portanto, ao ter fome nosso corpo naturalmente se encarrega de nos mostrar que precisamos nos alimentar. E, se nos sentirmos mal, é por conta da falta de alimento que pode ser altamente prejudicial às atividades relacionadas à sobrevivência. E mais que isso, a inanição pode dar fim à vida.
Continuando nosso paralelo com nossa vida espiritual, comumente estamos dentro da igreja rodeados de bons ensinamentos, lemos bons livros, temos acesso à informação e a pessoas que são boas influências para nós espiritual e intelectualmente. Temos um lugar saudável para crescer e, ainda assim, nos encontramos incompreensivelmente apáticos. Este é um enorme perigo na vida do cristão. Temos ao nosso alcance tudo que precisamos para nos satisfazer, mas escolhemos viver uma vida distante dos banquetes que a presença de Deus pode nos oferecer. Precisamos aprender a nos posicionar contra a apatia e a falta de ânimo. Precisamos clamar para ter fome por algo de Deus.
Observe como é paradoxal:
Ao mesmo tempo que saímos da igreja em busca do perdido, intensificando trabalhos evangelísticos e investindo em mobilizações específicas em escolas, hospitais, orfanatos, casas de prostituição e em muitos outros lugares, para atender a todas essas pessoas famintas e oferecer-lhes a verdadeira comida, dentro da igreja experimentamos um aumento da frieza e indolência que só a falta de fome pode explicar.
Sei que pode parecer confuso, acredito que paradoxos geralmente têm essa característica: nos movem a pensar em busca de entendê-los no início e, depois que o compreendemos, terminam nos impactando por sua força contraditória. Observar algo que não corresponde à lógica ou ao senso comum deve rapidamente nos despertar para a realidade e nos impulsionar a caminhar com intencionalidade e clareza. O que está acontecendo que as pessoas chegam à igreja famintas, mas depois, contentam-se com a apatia?
Sempre que um ano chega ao fim eu começo a perguntar para Deus qual será o tema da minha vida na próxima estação e qual é a área em que eu devo focar no próximo ano. Peço um versículo bíblico que indique algum âmbito da minha vida em que Deus queira revelar mais do Seu caráter. Há alguns anos atrás, quando comecei a orar neste sentido, percebi que eu já vinha sentindo meses antes um desejo grande de ver uma manifestação maior dos dons do Espírito Santo, tanto na minha vida, quanto na das pessoas que eu liderava e na minha igreja. Era um clamor por avivamento, uma vontade de ver as evidências da manifestação do poder de Deus no meio do seu povo.
A fome por Deus como um presente
Então, senti claramente o Espírito Santo falar ao meu coração: “Peça por fome de Deus, esse é o melhor presente (dom) que você poderia receber”. Essa frase me deixou vulnerável diante de Deus. Eu comecei a perceber que, embora estivesse me alimentando nEle, precisava manter-me em um lugar de fome. E que isso não está relacionado ao meu tempo de devocional com Deus, a preparar meus estudos bíblicos ou manter uma vida cristã saudável. Mas a um desejo desesperado por mais de Deus que só Ele mesmo poderia gerar em mim. Do que adianta o poder sendo manifesto, pessoas sendo tocadas e milagres acontecendo, se estamos saciados?
Se não temos um intenso clamor por um encontro pessoal com Deus e nos contentamos em tocar apenas Suas manifestações externas, quando estamos espiritualmente desnutridos por estarmos nos alimentando somente do mover, é assim que, quando menos esperamos, a indiferença e mornidão são mascaradas por um senso de sucesso espiritual, porque vemos o Reino sendo manifesto. Em outras palavras, do que adianta este Reino se manifestar externamente enquanto em nosso interior permanecemos apáticos e inertes em nossa busca pessoal rumo ao coração de Deus? E eu não penso que desejar a manifestação do poder de Deus seja errado. Penso apenas que esse desejo deveria ser uma consequência de quem está desesperado por Deus e tem uma fome que transforma e reorganiza a intenção pela qual buscamos poder.
Sermão do Monte
Muitos chamam o Sermão do Monte de constituição do Reino de Deus, isso significa que nele nós encontramos direções para viver um estilo de vida que aponta para esse Reino. Nesta mensagem, Jesus nos chamou à perfeita obediência e sua própria vida na terra é o modelo em que devemos nos espelhar. No sermão do monte Jesus menciona oito bem-aventuranças, que são direcionamentos para nós, além de servirem como parâmetros para analisarmos nossa jornada em Deus ao longo dos anos. Quero destacar uma dessas bem-aventuranças que está escrita em Mateus 5:6:
“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, pois serão saciados”.
A fome por Deus
Trata-se primeiramente de um clamor no íntimo, um anseio ardente por uma vida que esteja alinhada com a santidade de Deus e de uma busca incansável por amá-lO com todo o coração, mente e forças. Quando Jesus declara que é bem-aventurado, feliz ou alegre aquele que tem fome e sede por JUSTIÇA, Ele não está se referindo à justiça no sentido de justificação ou salvação, nem de julgamento e condenação. Jesus diz por justiça a retidão moral, o desejo profundo por ter uma vida separada e de total entrega, estes terão seus anseios satisfeitos.
Entendemos justiça como um alinhamento, como a criação funcionando corretamente, da maneira que o criador a formou para estar. A justiça a qual aqueles que têm fome receberão é a da integridade em suas próprias vidas, nas vidas daqueles que os cercam e na sociedade. Sim, estes que têm fome estendem este desejo às pessoas que influenciam e aos ambientes que frequentam. A palavra “saciados” também tem neste texto uma conotação diferente daquela a qual estamos acostumados.
Quando, literalmente falando, temos fome de comida, comemos e então ficamos saciados, a fome passa. Diferente do “saciar-se” que recebemos como recompensa pela fome e sede de justiça, dito por Jesus, que tem em si a capacidade de gerar ainda mais fome. Você consegue entender como isso funciona? Você tem fome, é saciado, e em consequência, você fica com mais fome.
Por exemplo, sabe quando em um culto ou conferência você é tomado pelo Espírito e experimenta algo novo em Deus e tem um profundo encontro com Ele? E quando você volta para casa, você quer continuar vivendo aquela experiência em cada segundo da sua vida? Quer ler a bíblia todo o tempo, ouvir músicas que falem sobre Jesus e mudar tudo para viver só para Ele? É isso! Uma fome por Deus e por tudo dEle, nEle e para Ele que vai ser saciada. E isso, ao invés de diminuir a sua fome, vai aumentá-la.
É o que podemos chamar de saciedade insatisfeita: Você é saciado, mas não deixa de ter fome!
Eu amo que estamos nos movendo, que temos em mente que precisamos de avivamento e falamos disso como nunca antes. Avivamento é o tema de conferências e o alvo de estudos. Quando buscamos a palavra “avivamento”. Mas o avivamento é apenas o fruto, sua semente é a fome. Seria viável obter o fruto sem a semente? Possivelmente há uma inversão de valores. Nosso anseio maior não deve ser o avivamento, mas a fome por Deus, e em consequência, o avivamento virá.
Quando cristãos famintos começarem a lamentar, clamar e se arrepender de seus pecados e dos pecados da sua geração, pedindo que a justiça e retidão de Deus invada sua sociedade, Deus se moverá para saciá-los, e Sua resposta será o verdadeiro avivamento esperado há tempos. Um avivamento que se inicia em corações quebrantados dá espaço para o Espírito de Deus agir. Então, a sujeira é lavada, o arrependimento é evidente. Um anseio para que a terra conheça Deus em verdade toca o povo tão profundamente, que homens são tomados por uma fome sem tamanho, não conseguem se conter e utilizam-se das plataformas para tornar Jesus conhecido. A fome gera o avivamento e o avivamento gera mais fome.
Por mais que você não possa produzir a fome em si mesmo, você pode posicionar-se para recebê-la do Senhor. Peça! É assim que você receberá a fome. Faça como aquela viúva persistente de Lucas 18 e bata até que a porta se abra. Persiga!
Minha oração
Que Deus aumente a fome pelo conhecimento de quem Ele é na igreja brasileira. Que o Seu povo tenha a certeza de que esta fome será satisfeita e a resposta trará um avivamento que resultará em retidão e alinhamento. Não só para a igreja, mas para nossa nação em todas as suas esferas. E se, porventura, a resposta não vier neste tempo, diante dos meus olhos, minha certeza é que mais cedo ou mais tarde ela virá. A promessa é sobremaneira encorajadora. Deus está dizendo que a fome será saciada, que este clamor será respondido e que o Seu povo receberá uma resposta às suas orações. Isso ocorrerá nestes dias ou no Reino que está por vir!