Estamos vivendo um momento em nossa história em que a política é mal vista em todos os ambientes, ângulos e modos. Com o cristão não é diferente. De fato, diante de tantos escândalos e exposições da corrupção dos políticos de muitas nações (principalmente da nossa), isso não se torna uma surpresa. No entanto, essa realidade pode ser um pouco proveniente de nossa ignorância, visto que, precisamos compreender primeiramente que a política, em sua essência, não é má. De modo geral, a política é uma ferramenta de organização social, de adaptação de ordens, de leis e regras. É o modo de colocar as coisas em ordem de forma que uma sociedade, uma família ou qualquer que seja a instituição, funcione corretamente.
Espaços políticos
Possivelmente você discorde repentinamente ou até se assuste com essa informação, mas não há como viver em uma sociedade sem política. É isso mesmo! Na verdade, não temos a mínima condição de viver em uma sociedade anárquica, em que cada um vive como entende. E se tivermos a consciência das condições reais da humanidade, isso no mínimo nos daria o relance do caos sem dimensão que seria. Vou te dar exemplos práticos sobre algumas formas de política as quais não podemos simplesmente ignorar. Você participa de uma igreja onde, para tomar algumas decisões, se fazem assembleias? Você faz parte um grupo de convívio? Veja, isso é uma forma de política. Você mora em um condomínio onde existem reuniões para votação de decisões referentes ao lugar? Então, isso é política. Sua igreja apresenta uma divisão em departamentos, responsáveis por resolver questões e trabalhar em prol de um melhor funcionamento da instituição? Simplesmente isso é política.
Não há como viver sem política, mesmo em ambientes eclesiásticos. Logo, isso nos mostra que a política não é em si mesma má. Mas, então, você pode estar se perguntando: Há como fazer uma política boa? Sim! Sem dúvidas. A política está presente em nossas escolas, famílias, trabalho e em nossas relações. Então, administração política é imprescindível para nossa sociedade.
Provavelmente você possa pertencer a grupos de pessoas que afirmam que: “política não é importante e nem boa porque não tem política na bíblia”. Isso é verdade?
A política nas Escrituras
Quem falou que não tem política na bíblia? Vejamos.
“Tu estarás sobre a minha casa, e por tua boca se governará todo o meu povo, somente no trono eu serei maior que tu.” Gênesis 41.40 “…por tua boca se governará todo o meu povo”.
Essas são palavras de Faraó a José, o qual se tornara governador ao seu lado em uma posição política. Há outros exemplos de posições políticas na bíblia como Daniel, que em seu tempo tornou-se um personagem importantíssimo na corte da babilônia e Ester, que se tornou uma ferramenta de Deus para salvar os Hebreus exercendo tal característica. Assim como o rei Salomão e o rei Davi, que também atuavam politicamente sobre seu povo, e historicamente Israel que esperava a vinda do Messias, o qual iria transformar a história com uma postura política. E sim, Cristo virá e terá uma posição política sobre toda a terra!
Mas, então, qual seria o problema? A explicação consiste na má política e no jogo político como troca de favores, esquemas e a busca do autobenefício. Tudo isso, no entanto, expõe uma corrupção já contida no próprio coração. O erro não está em um cristão assumir posições políticas em seu município, cidade ou estado, e sim que, por conta dessa corrupção e de um sistema maligno dominante, a máquina pública praticamente “funciona” por si só, e um cristão ao entrar é levado ao jogo dominante. Isso significa que não existe um político honesto? Não, porém, quando encontrado é considerado como um herói ou é visto com mais desconfiança ainda devido a tanto descrédito.
O Cristão na política
O questionamento agora é: “Como um cristão deve se enquadrar no espectro político? O Cristão deve assumir uma posição política? Abraçar um partido? É… Isso nos obriga a uma fundamentação mais difícil e talvez mais polêmica: Cristo tinha uma posição política?
É absolutamente impossível esgotar esse assunto neste breve artigo, e existem muitas pessoas capacitadas cujas explicações são vastas sobre o mesmo. Não obstante, irei deixar aqui alguns pontos, os quais considero de extrema importância para a nossa reflexão sobre o tema:
Um breve histórico
Primeiro: O significado de “política” na Palestina do 1º século é muito discrepante do nosso entendimento de política, pois a ciência moderna, tampouco a ciência política existiam. Ao invés de constituir uma das esferas da sociedade como experimentamos nos últimos séculos, a política antiga era integrada no sentido religioso da vida. Por exemplo, o Imperador César Augusto era o “pai” do Império, e o filho de Apolo para governar o mundo. No entanto, a palavra “kyrios” ou “senhor” captura bem todos esses sentidos e não é à toa que a primeira confissão da igreja foi “Jesus Cristo (e não César) é o Senhor”.
Jesus foi perseguido e morto por uma trama de partidos inimigos, os fariseus, os quais eram uma seita apocalíptica e influente fora de Jerusalém, uniram-se com a elite do Templo (saduceus) e com os herodianos (pró-Roma) para incriminá-lo e matá-lo. Quando chegou a hora de ser preso, Jesus fez questão de deixar claro que sua práxis e objetivos não se enquadravam aos dos revolucionários zelotes (“quem levantar a espada, pela espada morrerá”). Alguns estudiosos tentam aproximar Jesus ao movimento Essênio, porém, não há base textual suficiente para tal afirmação. Jesus, portanto, incomodou a posição de muita gente, para não dizer, de todas as gentes, afinal, Ele não se enquadra em nenhuma caixa.
Jesus e o Reino de Deus
Segundo: A preocupação com os pobres, oprimidos e a centralidade para o cuidado com o vulnerável é simplesmente INEGÁVEL na vida de Jesus, dos primeiros apóstolos, da igreja primitiva e mesmo da patrística. Jesus, como representante da tradição profética (“o último dos profetas”, o filho de Deus em quem toda profecia e lei se realizaram), era incansável em apontar a bem-aventurança dos pobres, condenar o abuso das riquezas e insistir que os que tinham dividissem com quem não tinham. Jesus afirmava que o Reino de Deus é o lugar dos que abrem a vida e comunidade para os excluídos pelo sistema Imperial e pela elite do templo, até mesmo firme posição sobre questões sexuais e forma como essa questão era tratava em sua época (leia o Evangelho de Marcos 7).
Terceiro: O tema central da sua pregação era “o Reino de Deus”, e infelizmente, em muitos contextos evangélicos, o entendimento consiste em “ir para o céu imaterial quando eu morrer”. Entretanto, o Reino de Deus, segundo a oração do Pai Nosso, é a pregação de que a realidade Divina está invadindo, redimindo e transformando nossa condição presente.
Sinalizadores de um Reino
O termo Shalom (paz) era o alvo: toda a criação, todos os sistemas e toda a humanidade deveria funcionar em justiça, amor, equidade e responsabilidade. O mundo perdido de Gênesis não seria encontrado em uma volta para o jardim. E, sim, em uma nova cidade – uma nova pólis, que o próprio Deus estava inaugurando em Jesus. Portanto, se somos cidadãos da nova pólis, devemos viver de acordo com sua política.
Mediante à exposição de tais questões, como cristãos e discípulos de Jesus, precisamos transformar nossa mentalidade e compreender que hoje somos sinalizadores de um Reino que será estabelecido sobre toda a terra e que os cristãos necessitam se envolver com políticas públicas para um bem comum social, e antes de ingressar em uma carreira política, questionar a si mesmo se possui vocação para a área, e se está disposto a governar uma cidade e não uma ideologia, igreja e afins. Como cristãos, devemos exercer nossa cidadania com lucidez e firmeza, aplaudir o correto e suplicar sempre por um governo justo para toda a sociedade e não apenas para os seus grupos religiosos.
Seguindo o conselho do apóstolo Paulo ao jovem Timóteo:
“Antes de tudo, recomendo que se façam súplicas, orações, intercessões e ação de graças por todos os homens; pelos reis e por todos os que exercem autoridade, para que tenhamos uma vida tranquila e pacífica, com toda a piedade e dignidade.” – 1 Timóteo 2:1,2
Não seja apenas uma voz de denúncia da injustiça, como também uma voz de súplica para os que governam.
Deus te abençoe.
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Parabéns pelo artigo!